correio do estado
Atualmente, decisões do Poder Judiciário têm feito parte do cotidiano da população brasileira, com intensa veiculação midiática. Este artigo pincelará, a partir da obra “A Justiça de Toga”, do jurista Ronald Dworkin, algumas questões, e, mais do que respostas, o que se pretende é ser um ponto de partida para as reflexões do caro leitor.
A figura do juiz, outrora “boca da lei”, com papel restrito ao que os diplomas legislativos prescreviam. Em um caminho de idas e vindas, os sistemas judiciários advindos desse modelo de pensamento foram modificados, ao menos parcialmente.
Alguns séculos de debate não foram suficientes para solucionar o dilema entre direito e moral. Dworkin, em relação às decisões judiciais: “se eles tiverem de lidar comquestões morais, seria um erro de categoria – como dizer a alguém com problemas com álgebra que tente usar um abridor de latas – dizer aos juízes que resolvam essas através da história, da economia ou de qualquer outra técnica não moral. ” (2010, p. 120). Aliás, ao considerar as questões de teoria do direito como questões morais, Dworkin expõe que: “deixaríamos de duvidar que a justiça tem um papel a desempenhar na determinação do que é o direito. Poderíamos, então nos concentrar na questão mais complexa e importante de saber, exatamente, que papel é esse. ” (2010, p. 51)
De acordo com Dworkin: “os cidadãos ficam mais bem protegidos contra a arbitrariedade e a discriminação quando os juízes que interpretam o direito e elaboram-no nos casos difíceis são responsáveis pela coerência” (2010, p. 354). Apesar de não constar um rol taxativo sobre coerência, o autor colaciona exemplos em termos de limitações para os fundamentos decisórios: “os juízes talvez não apelem a convicções ou objetivos religiosos nas sociedades liberais porque essas convicções não podem fazer parte de uma justificação geral e abrangente da estrutura jurídica de uma comunidade pluralista, liberal e tolerante. ” (2010, p. 359).
Em um regime democrático, o povo elege seus representantes para redação das leis. Porém, estas podem ser submetidas a exame judicial, quando incompatíveis com a Constituição, por exemplo, ao restringirem direitos fundamentais. E aqui não se trata de subverter a democracia, mas sim de fortalecê-la, por meio da jurisdição constitucional.
Outra questão trata da verdade objetiva nas decisões judiciais. Para alguns céticos pós-modernos, não haveria objetividade, mas apenas um viés subjetivo, psicológico (para os adeptos dessa teoria, o contexto e as motivações existiriam apenas na mente do julgador). Dworkin ironiza de modo veemente tal tendência: “Os fatos jurídicos não têm nenhuma relação causal com o sistema nervoso central dos juristas. ” (2010, p. 368).
O autor escreve sobre a verdade objetiva com a responsabilidade atribuída aos fabricantes de um medicamento pelos danos causados: “afirmará uma verdade objetiva se afirmar que sua verdade independe da crença ou da preferência de quem quer que seja: que, no estado atual do direito, os fabricantes seriam responsáveis mesmo que os juristas pensassem de modo diverso. ” (2010, p. 368). Ora, tal constatação é aplicável também a diversas outras situações, como aos que consideram o Estado um “balcão de negócios”, desviam o dinheiro público (destinado à saúde, à educação, etc.) e, assim, desafiam o império da Lei e a supremacia da Constituição.
A partir de Dworkin, foram trazidos aspectos referentes aos juízes e às suas decisões: direito e moral; limites das fundamentações judiciais; verdade (com as limitações inerentes às falibilidades humanas). Como tais questões encontram-se, implícita ou explicitamente, veiculadas cotidianamente, é mister proporcionar algumas reflexões, com o objetivo de formar uma opinião pública crítica e consciente.
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