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'Não é moda': casos de adolescentes que se cortam crescem e assustam

'Não é moda': casos de adolescentes que se cortam crescem e assustam

22/05/2018 às 20h28 Atualizada em 23/05/2018 às 00h28
Por: RegiãOnline
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CAMPO GRANDE NEWS

 

 

(Foto: Guilherme Henri)

 

Você pode estar no salão de beleza e ouvir sobre a menina de 12 anos que se corta. Você pode estar em sala de aula e perceber que a simples batida em um móvel logo faz verter sangue dos punhos de um aluno. Você pode ser surpreendido sobre a história da adolescente que já leva lâmina, embrulhada com esmero, junto ao corpo.

Mas só há surpresa no mundo dos adultos, pois, longe de modinhas como a “Baleia Azul” (jogo suicida), os adolescentes logo contam que enxergam na ferida viva dos cortes uma dor mais fácil de lidar.

Num grupo com dez adolescentes, entre meninos e meninas, na faixa etária de 14 e 17 anos, reunido perto de lanchonete fast food na avenida Afonso Pena, em Campo Grande, o tema primeiro é recebido com risadas. Mas, não demora para que uma estudante mande a real. “75% da minha sala de aula se corta”, diz a garota.

A automutilação ganha narrativa na voz de um estudante de 16 anos. “Me sentia muito sozinho, estava passando por problemas pessoais. As pessoas dizem que é uma dor mais fácil de lidar”, diz. Os cortes foram no punho e em três ocasiões. “Fui flagrado pela minha mãe, que me chamou para conversar. Faz dois meses que não me corto mais”, diz o rapaz, que estica o braço e, sobre um marca recente, conta que foi o machucado foi feito por um gato.

Dores da adolescência - As dores da adolescência não passam despercebidas no ambiente escolar. Na Reme (Rede Municipal de Ensino), profissionais de escolas de Campo Grande passaram por capacitação inédita para orientar professores, diretores e coordenadores pedagógicos sobre como detectar sinais de depressão.

“No início desse ano, alguns alunos sinalizaram essa questão da automutilação e começou a nos preocupar muito. O aluno da rede municipal de ensino é nosso e qualquer fator desagradável, estado de dor, de sofrimento, nós precisamos acolher e buscar solução para isso. Muitas vezes a família nem está sabendo”, afirma a superintendente de Gestão e Normas da Semed, Alelis Izabel de Oliveira Gomes. A rede de ensino tem 104 mil alunos.

Na escola, a automutilação é descoberta quando a confiança faz com que o aluno desabafe com o professor ou em situações do dia a dia. Como o estudante que sempre mantem os punhos encobertos ou quando pequenos acidentes, como simples batida no móvel, logo sangra a pele cortada com lâmina.

Segundo Alelis, a situação é levada para a direção ou coordenação pedagógica, que aciona equipe com psicólogo. “Campo Grande é a primeira Capital a implantar essa formação, saímos na frente nesse sentido de prevenção. Se a gente encontra um caso, já é muito. Você imagina o tamanho da dor que ele está sentindo por dentro quando se automutila? A dor dele é imensa. Precisa ser acolhido pela família, escola, amigos”, afirma.

Educadora há 45 anos, Alelis acompanha as mudanças dos adolescentes, que, na atual sociedade pós-moderna, têm acesso aos mais variados meios de comunicação. Contudo, ter meios para desabafar não garante o mesmo acolhimento de ouvidos atentos e preocupados.

“Os pais têm que que ficar atentos. Essa relação de confiança também tem que ser estabelecida dentro de casa. Onde o adolescente vai desabafar? Na rede social. Mas a rede social não faz a devolutiva do acolhimento. Ela não acolhe e determinadas pessoas acabam fomentando isso”, diz a superintendente.

Muito triste - “ A automutilação vem crescendo. É uma realidade muito triste e a faixa etária de incidência vem diminuindo”, explica a psicologa Karolina Leite. O ato de se cortar é mais comum nas meninas.

Sobre o motivo de se infligir sofrimento físico, a explicação é de que a dor concreta é considerada mais fácil de lidar. “A automutilação é uma tentativa, não saudável, de diminuir o sofrimento emocional. E está ligada a caso de depressão. A pessoa não está bem, se sente angustiada, triste, não consegue lidar com a emoção e transforma essa dor em física”, afirma a profissional. Ou seja, a dor física seria mais fácil de lidar do que a dor emocional.

Apesar de ser vistos ruidosos, em grupos e, aparentemente, despreocupados por aí, a depressão encontra os adolescentes na fase de turbulência, que vão de questões sociais ao fato de o cérebro nem estar completamente formado.

A psicóloga lembra que os dias não são fáceis nessa faixa etária. “É o período mais complicado na nossa vida. Porque mudam os desafios, as cobranças. Antes o mundo era a minha família, agora o mundo se volta mais para os amigos. A pessoa é julgada. Vai ser aceita, não vai ser aceita. Também é o início da sexualidade, dos interesses românticos. São vários e vários fatores desafiantes”, afirma Karolina.

Para os pais, a profissional alerta que é preciso ficar atento ao comportamento, como o cuidado de ocultar sempre o corpo e sinais depressivos (isolamento social, queda nas notas, agressividade).

“Se descobrir que seu filho está praticando automutilação, tente não julgar. Porque julgar é diferente de orientar. O adolescente precisa de uma rede de apoio”. A psicóloga destaca que a adolescência passa, mas a depressão só melhora com tratamento adequado.

 

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