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Após os desembargadores da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) terem confirmado a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e aumentado a pena fixada na primeira instância para 12 anos e 1 mês de prisão, manifestantes reuniram-se na Praça da República, centro paulistano, para manifestar apoio ao ex-presidente. Lula participou do ato e fez o primeiro discurso após a condenação em segunda instância na Justiça Federal.
“Eu nunca tive nenhuma ilusão com o comportamento dos juízes na questão da Lava Jato. Porque houve um pacto entre o Poder Judiciário e a imprensa, que resolveram que era hora de acabar com o PT e com a nossa governança no país. Eles já não admitiam mais a ascensão social das pessoas mais pobres desse país e dos trabalhadores. Eles não suportavam mais a ascensão da escolaridade, que ia da creche à universidade”, disse.
Lula criticou a decisão dos desembargadores que confirmaram a sua condenação, e pediu a apresentação de provas. “A decisão eu até respeito, porque foi deles. Eu não aceito é a mentira pela qual eles tomaram a decisão. Eles sabem que eu não cometi um crime. Eu me disporia a ficar com os três juízes um dia inteiro televisionado ao vivo, e eu quero que eles me mostrem qual é o crime que o Lula cometeu”.
O ex-presidente voltou a dizer que o apartamento do Guarujá, elemento central em sua condenação, nunca foi dele. “Se eles me condenaram, me deem pelo menos o apartamento, aí justifica. Me deem a escritura”, disse em tom descontraído.
Eleição
Lula disse que não queria mais fazer política em razão de já ter sido eleito presidente por duas vezes. No entanto, ressaltou que o resultado do seu julgamento fez ele voltar a desejar se candidatar.
“Eu até nem queria mais fazer política, eu já tinha sido presidente, mas agora, o que eu estou percebendo é que tudo o que eles estão fazendo é para evitar que eu possa ser candidato. Não é nem ganhar, é ser candidato. Essa provocação é de tal envergadura que me deu uma coceirinha e eu agora quero ser candidato à Presidência da República”, disse.
Lula enalteceu suas gestões quando presidente e valorizou o legado que deixou. Segundo ele, sua condenação não irá alterar a consciência política dos brasileiros.
“Eles não podem prender o sonho de liberdade, eles não podem prender as ideias, eles não podem prender a esperança. E o Lula é apenas um homem de carne e osso. Eles podem prender o Lula, mas as ideias já estão colocadas na cabeça da sociedade brasileira, as pessoas já sabem que é gostoso comer bem, já sabem que é gostoso morar bem, as pessoas já sabem que é gostoso viajar de avião, já sabem que é gostoso comprar carro novo”.
O ex-presidente confirmou ainda que irá viajar a Etiópia na próxima sexta-feira para participar de discussões sobre combate à fome, e retornará ao país na segunda-feira.
A concentração teve início antes do voto do desembargador Victor Luiz dos Santos Laus, o último a votar. Do carro de som, onde uma faixa dizia “Eleição sem Lula é Fraude”, lideranças políticas e sindicais protestaram contra a condenação e defenderam o direito do ex-presidente de disputar as próximas eleições, em outubro deste ano. “Hoje foi um dia de farsa em Porto Alegre”, disse o coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos. “Passaram o dia falando, sem conseguir apontar nenhuma prova contra esse cidadão”, continuou, apontando para Lula ao seu lado.
Ato contrário
Na Avenida Paulista, no vão-livre do Museu de Arte de São Paulo (Masp), manifestantes ligados aos movimentos Nas Ruas e Brasil Livre (MBL) comemoram a decisão do TRF4.
Mais cedo, antes do fim do julgamento, a porta-voz do #NasRuas, Carla Zambelli, disse que o voto do relator, João Pedro Gebran Neto, foi coerente. "Confiamos na Justiça de primeira e segunda instâncias, o que tememos são as manobras que podem acontecer no âmbito do Supremo", disse Carla.
O representante do MBL, o vereador Fernando Holiday, também afirmou que esperava decisão unânime que "assim dificultaria a candidatura dele".
Rio de Janeiro
No Rio de Janeiro, manifestantes se reuniram a partir de 16h na Avenida Rio Branco, no centro da cidade, em defesa do ex-presidente. Eles acusaram o Judiciário de perseguição política a Lula. Na opinião de Roberto Ponciano, dirigente da Central Única dos Trabalhadores (CUT) no estado, o julgamento foi um "retrato simbólico da história de opressão praticada pelas elites do país" ao descrever sua visão sobre o evento. "Temos uma sala com três homens brancos, descendentes de famílias privilegiadas desde o período colonial, muitas das quais proprietárias de escravos. E eles estão julgando um retirante nordestino, enquanto uma negra serve o cafezinho", disse.
Quatro argentinas que estão de férias no Rio de Janeiro se fizeram presentes no ato. Segundo Yamila Fernandez, de 20 anos, elas se informaram da manifestação e decidiram comparecer em solidariedade aos brasileiros e em apoio à Lula. "Na Argentina, está ocorrendo a mesma coisa com nossa ex-presidente Cristina Kirchner, que também se posiciona politicamente em defesa dos direitos dos trabalhadores e do povo em geral. Estas perseguições seletivas da Justiça são ataques dos setores conservadores que estão ocorrendo em nível latino-americano e, por isso, argentinos e brasileiros precisam estar juntos nessa luta", disse.
Ontem (23), grupos contrários a Lula promoveram um ato na cidade.
Manifestações
Durante todo o dia, manifestantes promoveram atos a favor e contra Lula em diversas cidades do país, inclusive em Porto Alegre, onde ocorreu o julgamento.
Entenda o caso
Os três desembargadores da 8ª Turma do TRF4 - João Pedro Gebran Neto, Leandro Paulsen e Victor Laus - rejeitaram hoje (24) recurso apresentado pelo defesa de Lula contra a condenação, aplicada no ano passado, pelo juiz federal Sérgio Moro. Na ocasião, o juiz, responsável pelos processos da Lava Jato na primeira instância condenou o ex-presidente a 9 anos e meio de prisão pelos crimes de lavagem de dinheiro e corrupção passiva no caso do triplex do Guarujá (SP).
O colegiado entendeu que a decisão de Moro tinha embasamento em provas documentais e testemunhais e que Lula participou ativamente do esquema de corrupção envolvendo a Petrobras.
Na sentença de primeira instância, o juiz federal Sérgio Moro disse que ficou provado nos autos que o ex-presidente e a ex-primeira-dama Marisa Letícia eram de fato os proprietários do imóvel e que as reformas executadas no triplex pela empresa OAS provam que o apartamento era destinado a Lula e faziam parte do pagamento de propina ao ex-presidente por ter beneficiado a empreiteira em contratos com a Petrobras.
No recurso apresentado ao TRF4, a defesa alegou que a análise de Moro foi “parcial e facciosa” e “descoberta de qualquer elemento probatório idôneo”. Os advogados afirmaram que um conjunto de equívocos justificava a nulidade da condenação. Para a defesa, o juiz teria falhado ao definir a pena com base apenas na “narrativa isolada” do ex-presidente da OAS José Adelmário Pinheiro Filho, conhecido como Léo Pinheiro, sobre o que os advogados consideram “um fantasioso caixa geral de propinas” e a suposta compra e reforma do imóvel. Na sessão de hoje, os advogados voltaram a argumentar que Moro agiu de forma parcial e houve cerceamento da defesa.
Na sessão, os desembargadores decidiram também aumentar a pena para 12 anos e um mês de prisão em regime fechado.
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